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29 de outubro de 2010

LINFOMA DE HODGKIN

INTRODUÇÃO
É um tumor maligno do Sistema Linfático em que há a presença de células indicativas chamadas células de Reed-Sternberg (células R-S, conhecidas como células em “olhos de coruja”). Tal quais as demais tumorações de caráter maligno, há proliferação descontroladas de células (principalmente linfócitos B dos centros germinativos ou nos centros pós-germinativos) sem que haja um controle efetivo pelo Sistema Imunológico da pessoa acometida.
Anteriormente, esse câncer era conhecido como “Doença de Hodgkin”; Dr. Thomas Hodgkin (1798 -1866) foi um proeminente médico inglês e foi quem primeiro descreveu o conjunto de sintomas dessa doença, no ano de 1832. Por outro lado, a denominação das células mencionadas é uma homenagem aos pesquisadores Dorothy Reed Mendenhall (1874-1964) e Carl Sternberg (1872-1935), que foram os responsáveis por descrever a microscopia das células de Reed-Sternberg.
Dr. Thomas Hodgkin (1798-1866)


EPIDEMIOLOGIA
Nos últimos 50 anos, o número de casos permaneceu estável, enquanto a mortalidade foi reduzida em mais de 60% desde o início dos anos 70 devido aos avanços no tratamento (Instituto Nacional do Câncer – INCA). No ano de 2006, o INCA lançou dados de mortalidade por LH de 431 mortos pela doença, sendo 233 homens e 198 mulheres. Para o ano de 2009, a estimativa de novos casos foi de 2870, sendo 1600 homens e 1270 mulheres. O LH pode acometer pessoas de quaisquer faixas etárias, mas é observado com mais frequência em jovens entre 25 e 30 anos de idade.


ETIOLOGIA
No estudo das características das células cancerígenas (ou seja, as células R-S), houve a percepção de que, na maioria dos casos, o LH surge de mutações nos linfócitos B e, mais dificilmente, nos linfócitos T. A maioria dessas células possuem genes de imunoglobulina identicamente rearranjados, o que sugere hipermutação somática a partir de células B de  centros germinativos ou de centros pós-germinativos. Algumas poucas células R-S têm arranjos de receptores de células T, sugerindo que estas tenham surgido de mutações nestas células.  As causas dessas mutações, como na maioria dos cânceres, são desconhecidas. Contudo, alguns agentes patogênicos são apontados, dentre eles o vírus Epstein-Barr (EBV). Células tumorais EBV-positivas expressam LMP-1 (proteína latente da membrana 1), uma proteína codificada pelo genoma do EBV com atividade transformadora. O EBV é bastante freqüente nas células R-S no subtipo Celularidade Mista. No tópico GENÉTICA serão discutidos mais detalhes.


CARACTERÍSTICAS GERAIS E CLÍNICAS
Por se tratar de um câncer de Sistema Linfático (e este está “espalhado” por todo o corpo, sendo constituído por linfonodos, vasos linfáticos, “tonsilas”, baço, timo,etc), o LH pode-se iniciar em qualquer lugar do corpo; todavia, o nódulo inicial surge geralmente sobre o diafragma. O tumor inicial acomete inicialmente um único linfonodo e se propaga contiguamente (seguindo a distribuição anatômica). A disseminação é particularmente previsível, tendendo a seguir a ordem: doença linfonodal → comprometimento esplênico → comprometimento hepático → comprometimento da medula e doença extra nodal.
 A Organização Mundial da Saúde (OMS), divide em cinco subtipos o LH (Quadro LH-1), cada um possuindo suas próprias características segundo a celularidade, a imunofenotipagem das células R-T e a clínica apresentada.
Quadro LH-1

Os subtipos Esclerose Nodular, Celularidade Mista, Ricos em Linfócitos e Depleção Linfocitária possuem as células R-T com imunofenotipo semelhantes, sendo então chamadas “formas clássicas de LH”. Os diferentes subtipos podem ocorrer em resposta a um importante fato da fisiopatogênese da doença: são secretadas citocinas pelas células R-S (p.ex.: IL-5, IL-6, TNF, GM-CSF), atraindo células reativas específicas, o que leva à formação de um infiltrado que contribui para o crescimento e sobrevivência das células tumorais.
Os sinais e sintomas dessa doença são variados, sendo os mais comuns:
1) Fadiga
2) Febre e calafrios que aparecem e desaparecem
3) Prurido em todo o corpo, sem outra causa desencadeante
4) Hiporexia/anorexia
5) Sudorese noturna
6) Linfadenopatia no pescoço, axilas ou virilhas: gânglios aumentados, endurecidos e indolores
7) Perda de peso
Outros sinais e sintomas podem estar presentes, sendo eles: tosse, dores no peito, problemas respiratórios, transpiração excessiva, dor ou sensação de plenitude no quadrante superior do abdômen (devido ao baço ou o fígado inchado) e rubor na pele.

CURIOSIDADE
É relevante que se diferencie o Linfoma de Hodgkin (LH) do Linfoma Não-Hodgkin (LNH). O LNH frequentemente acomete sítios extranodais e propaga-se de modo imprevisível, manifestação diferente dos LH que, como será mais detalhado adiante, tendem a ter propagação previsível e inicia-se em linfonodos.

MACROSCOPIA
Por não ser possível diagnosticar um LH macroscopicamente (por confundir-se com a imagem dos demais linfomas), o diagnóstico é feito pela histologia. Na peça, entretanto, é visualizada uma superfície lisa ao corte,  além de homogênea e palidamente amarelada. 
Imagem de um lifonodo acometido, apresentando uma superfície lisa. Observe o tamanho do linfonodo (~8,5cm)

MICROSCOPIA
A microscopia desse linfoma não se restringe à apresentação do tumor em si, mas as características das células de R-S e a descrição do estadiamento são peças fundamentais para o bom entendimento dessa doença.
A microscopia geral do tumor é um tecido neoplásico de padrão difuso, com perda da arquitetura do linfonodo e porções de fibrose e necrose são visualizadas.
Ao corte histológico, é também possível a visualização de um infiltrado inflamatório que definirá o subtipo do LH. De toda forma, são descritos na microscopia linfócitos, eosinófilos, plasmócitos e outras células inflamatórias. São identificadas células com mitoses atípicas, item comum nas neoplasias malignas.
As células R-S são grandes células (15-45 μm) com núcleos múltiplos ou com um único núcleo com múltiplos lóbulos. Cada núcleo ou lóbulo possui nucléolos grandes, de tamanho semelhante a pequenos linfócitos. O citoplasma é abundante e ela possui diversas variantes conhecidas, tais quais: variantes mononucleares, variantes lacunares e variantes linfo-histocíticas (Quadro LH-2).
Quadro LH-2
IMUNOISTOQUÍMICA

Tumores imunopositivos para CD30
Imagens da dissertação de mestrado de Mário Henrique Magalhães Barros - LINFOMA DE HODGKIN NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA: UM ESTUDO DAS CARACTERÍSTICAS HISTOLÓGICAS, CLÍNICAS, EPIDEMIOLÓGICAS E DE ASSOCIAÇÃO COM O VÍRUS EPSTEIN-BARR
Tumores A, B e C são imunopositivos para CD15 e tumores D, E e F são imunopositivos para CD20
Imagens da dissertação de mestrado de Mário Henrique Magalhães Barros - LINFOMA DE HODGKIN NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA: UM ESTUDO DAS CARACTERÍSTICAS HISTOLÓGICAS, CLÍNICAS, EPIDEMIOLÓGICAS E DE ASSOCIAÇÃO COM O VÍRUS EPSTEIN-BARR
ESTADIAMENTO
O estadiamento, é feita a análise do exame clínico bem como a utilização de vários procedimentos de investigação (como imagens radiológicas e biópsia de linfonodos).  São definidos quatro estágios, de acordo com a distribuição da doença, e ainda são subdivididos em A (ausência) e B (presença) dos seguintes sintomas: febre elevada, sudorese noturna e/ou perdad e peso (>10% da massa corporal). Esse estadiamento é utilizado para LH e LNH, e recebe o nome de “Classificação Ann Arbor”, em menção ao comitê formado em 1971, na cidade de mesmo nome (em Michigan), que elaborou os critérios classificativos. Os Estágios são definidos como:
a) Estágio I: acometimento de uma única região do linfonodo (I) ou de um único órgão ou local extralinfático (IE);
b) Estágio II: acometimento de somente duas ou mais regiões de linfonodo no mesmo lado do diafragma (II) ou com acometimento limitado de órgão ou tecido extralinfático contíguo (IIE);
c) Estágio III: acometimento de regiões do linfonodo nos dois lados do diafragma (III), podendo incluir o baço (IIS) e/ou acometimento limitado de órgãos ou local extralinfáticos contíguos (IIE/IIIES);
d) Estágio IV: focos múltiplos ou disseminados de acometimento de um ou mais órgãos ou tecidos extralinfáticos, com ou sem acometimento linfático.

PLOIDIA, CITOGENÉTICA E GENÉTICA
Algumas alterações genéticas são reconhecidas no LH, dentre elas aquelas possibilitadas pela interção das células tumorais com o EBV (células R-S EBV-positivas). Quando há a expressão da proteína anteriormente mencionada (LMP-1), há uma transmissão de sinais que fazem a regulação aumentada do NF-κB (fator de transcrição importante para a ativação de linfócitos). Ressalta-se que há ativação de NF-κB mesmo em tumores EBV-negativos, o que possibilita inferiri que a ativação inadequada desse fator nuclear é um evento comum em LH clássicos.
Há também casos de alterações nos genes das imunoglobulinas das células R-S, que impedem a expressão de imunoglobulinas de superfície. Essa expressão permitiria a sobrevivência de células B nos centros germinativos.
As células de R-S são aneuplóides e possuem, com frequência, aberrações cromossômicas como adições do cromossomo 2p, região do proto-oncogene c-REL e regulação aumentada da ativação do NF-κB.

PROGNÓSTICO
O índice de cura é próximo de 90% para aqueles pacientes com LH estadiado como I e IIA. Na doença avançada (Estágios IVA e IVB), há entre 60-70% de chance de o paciente obter uma sobrevida de 5 aos livre da doença.
Ressalta-se que há riscos de desenvolver câncer posterior ao tratamento radio- e quimioterápico, a que se denomina malignidade secundária. As síndromes mielodisplásica, a leucemia mielóide água e o câncer de pulmão são as manifestações mais comuns dessa malignidade secundária.

REFERÊNCIAS
1. Robbins & Cotran; Patologia: Bases Patológicas das Doenças; 8ª Edição, 2009
2. http://www.cancer.gov/cancertopics/types/hodgkin
3. http://www.nlm.nih.gov/medlineplus/ency/article/000580.htm
4. http://www.worldlingo.com/ma/enwiki/pt/Ann_Arbor_staging
5. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/inca/linfoma_hodgkin_infancia_adolescencia_inserido_dados_lildbi.pdf
6. http://www.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=458

Audinne Ferreira e Silva
Acadêmica de Medicina
Liga de Patologia
Universidade Federal do Ceará


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